Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=hZCLAdeYEyk
Cara
procuradora:
O dia de ontem para mim foi bem
desagradável. Eu estava preocupada com alguns débitos, tentando estabelecer
prioridades entre eles. O atraso de minha aposentadoria também tem sido uma dor
de cabeça e ontem, em particular, me causou profunda angústia devido trâmites
burocráticos.
E foi exatamente quando estava a
tempo de desesperar-me que vi seu desabafo, com o qual prontamente me
identifiquei. Benditos algoritmos que parecem ouvir nossos pensamentos! Há um
amigo que me diz não haver coincidências, que nada acontece por acaso e eu estou
começando a acreditar.
Não foi à toa que sua fala,
viralizou. Faço questão de transcrevê-la:
"Meu pai
morava na... eu morava no Setor Sul. Meu pai descia com a Caravan dele de ponto
morto para economizar a gasolina. Quantas vezes eu deparei com isso! "Pai,
por que você tá pondo assim?", "Para economizar gasolina". Isso
é verdade, gente, é triste, mas foi o que eu passei. Meu pai aposentou-se para
poder advogar e pagar nossa escola, que estava atrasada 6 meses. O dia que ele
completou o tempo de serviço, no outro dia, ele pediu aposentadoria. Vocês
podem olhar. Qualquer um que se interessar pode saber disso."
"Pensemos nos
promotores, porque eu sou uma mulher. Graças a Deus, meu marido é independente.
Eu não sou, eu não mantenho minha casa. O meu dinheiro é só para mim, para
fazer minhas vaidades. Graças a Deus, só para os meus brincos, minhas pulseiras
e meus sapatos. Mais uma coisa, eu falo: eu tenho dó dos promotores que estão
iniciando aqui a carreira, porque os promotores que têm filhos na escola têm
que pagar. Porque eu já vi, o custo de vida é muito caro. Então, eu agradeço a
oportunidade. Desculpe se eu me exaltei, e eu não sou nenhuma oradora, mas eu
falei de coração. E quem fala de coração, fala a verdade. Muito obrigada."
Ao ver o seu vídeo, não pude
conter a emoção e vislumbrei quanta ingratidão havia em meu coração. Cumpriu-se
em mim o aforismo que diz: “Eu estava triste porque não tinha sapatos, até que
encontrei alguém que não tinha pés.”
Foi catártico ouvir tão sinceras
palavras acerca do drama vivido por V. Exa. e pelos demais colegas seus. Não
sei como conseguiu conter as lágrimas ao fazer tão impactante desabafo.
Lembrei-me do que mamãe sempre dizia: "A medida do ter nunca se
enche". Eu, que nunca precisei economizar na gasolina no meu percurso
até o trabalho, estava chorando de barriga cheia. Sim! Havia acabado de comer
cuscuz com ovos.
Seu exemplo encorajou e
continuará a ter efeito positivo sobre os demais promotores. É como disse sua
colega nessa mesma sessão do CPJ:
“Estamos hoje em uma
situação de pires na mão. Humilhados e agachados diante de todos os servidores
de carreira jurídica no Estado”.
Que vergonha para Goiânia! Que
vexame para o Brasil!
Logo me senti impelida a
compartilhar seu vídeo, para contribuir com a sua causa. Todavia, pra minha
surpresa, recebi feedback nada agradável de alguns que antes me pareciam mais
sensíveis. Um deles, do grupo de trabalho, riu e disse que vossa excelência
deveria estar em estado de embriaguez ao gravar aquele vídeo. Imediatamente o
corrigi e sugeri que se colocasse em seu lugar. Falei-lhe de alteridade e de
empatia – algo que vossa excelência praticou ao pensar em seus pares:
“Uma coisa eu falo: eu tenho dó dos promotores
que estão iniciando a carreira, os promotores que têm filhos na escola, porque
hoje o custo de vida é muito caro”...
Uma colega, demostrando o quanto
vive fora da realidade, disse que vossas palavras só podiam ser
brincadeira.
Acabei me desentendendo com quem
a classificou como uma pessoa desconectada da realidade e bloqueei a outro que
a chamou de burra. Dei bronca em quem disse: “É uma infeliz. Ainda bem que leva
terra na cara igual a nós.”
Disse a colegas contenciosos
que nossas categorias precisam se unir. Temos uma luta em comum! De tão patente
o drama vivido por vossas excelências, tentam conformá-los e silenciá-los
concedendo-lhes auxílios-alimentação, transporte, moradia, ajudas de
custo e creche. Hoje, ao ir à padaria, alguém me pediu um
auxílio. Não tive como não me lembrar de vocês.
Esses amigos e amigas que assim
reagiram, em seu descolamento do mundo real, só faltaram dizer como a rainha:
"Não têm pão? Comam brioches!"
Depois de ouvi-la, eu entendi
porque a justiça, como dizem, anda tão mal das pernas. É a subnutrição.
Percebi que V. Exa, não estava
legislando em causa própria, pois tem um marido que supre sua deficiência
salarial.
“Eu sou
uma mulher que, graças a Deus, meu marido é independente e eu não mantenho
minha casa. Meu dinheiro é só para eu fazer minhas vaidades, graças a Deus. Só
para os meus brincos, as minhas pulseiras e os meus sapatos”...
Vemos, nas Redes Sociais, a
manifestação do que há de pior no ser humano. Um singelo desabafo como o de V.
Exa., pode se transformar em motivo para linchamento virtual e motejo. Onde
iremos parar? Deus, a quem Vossa Excelência como boa cristã agradece em sua
fala, não tem sido invocado como devia e o resultado é essa demonstração de
insensibilidade.
V. Exa. Me deixou a pensar
naqueles promotores e procuradores que não dispõem de alguém que assuma as
despesas comuns. Quem usa bijuterias - é o caso de pessoas acima
referidas - não tem condições de entender o drama de quem gasta com joias
valiosas. Quem vive de quentinhas, como entenderá o drama dos que frequentam os
restaurantes mais caros? Pode alguém que faz vaquinha para ir em alguma
excursão à praia entender o drama de quem faz viagens internacionais, cujos
filhos frequentam os mais caros colégios? Claro que não. Agora entendo porque
vocês são chamados de "procuradores", pois são dores que vocês acabam
encontrando nessa profissão.
Ainda bem que vez por outra entra
um dinheirinho extra para ajudá-la na satisfação das inocentes vaidades, como
ocorreu em dezembro passado, em que V. Exa. recebeu 92 mil e em abril do
corrente ano que lhe garantiu 54 mil. Esses acréscimos periódicos devem
amenizar o sufoco.
Concordo plenamente quando V.
Exa. diz que a categoria ganha pouco. Uma professora de Física me ajudou a
entender: A lua é 81 vezes menor que a Terra e a Terra um nada em comparação
com o Sol que, por sua vez, é uma estrela de quinta grandeza. Portanto, o vosso
salário é gigantesco em relação ao meu, mas pequeno diante de outros. Não é o
vosso salário que é grande, e sim o nosso que é extremamente pequeno. Leia
Pollyana Menina e depois Pollyana Moça. O jogo do contente poderá fazer
diferença na sua vida...
Sua humildade encantou-me. Há
quem queira viver de aparências, não é o seu caso. Expôs com franqueza o drama
vivido por seu pai. Como ele, também não vejo a hora de aposentar-me. Para
alguns colegas seus, a aposentadoria costuma vir como punição, mas para mim
será uma bênção.
Passarei a pagar meus impostos
com mais prazer a fim de possibilitar a vossa categoria um salário mais
digno!
Que vosso apelo seja ouvido
urgentemente.
Unamos nossas forças!
Mary Joana Prado, professora
Que resposta bem dada! ✨👏✨
ResponderExcluirTexto muito bem escrito. Adorei suas ironias inteligentes.👏👏👏 - Nelson Almeida
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