sábado, 25 de dezembro de 2021

CLUBE DA ALEGRIA - Heraldo Lins



 CLUBE DA ALEGRIA


Estou aqui na sala gelada. Acabei de parar um pouco para diminuir a temperatura do ar. Falei isto porque é só o que tenho no momento para informar. Relendo o que escrevi acho que ficaria melhor assim: às 15:51 parei para diminuir o ar, e, exatamente um minuto depois, voltei a escrever. Há pouco cruzei os braços por mais um minuto. Se alguém prestar bem atenção, perceberá que tudo que faço é sempre por um minuto. Coisa de estressado. 

Dei uma piscada para espantar o tédio e ver se chega algum assunto importante. Na verdade, não foi uma piscada, foi uma levantada de sobrancelhas e parece que funcionou, pois lembrei-me que um condenado pegou quarenta anos de prisão em regime fechado. Vivia apalpando as mulheres. Que crime horrível. As mulheres não foram feitas para serem apalpadas sem suas permissões.   

Recebi, agorinha mesmo, um convite para participar de um Réveillon. Não vou! Alguém deve ganhar muito dinheiro com estas festas. No outro dia estarei mais triste do que agora. Não resolve. Em lugares que falta água as pessoas deveriam fazer velório das torneiras. 

Acho que vou formar um clube dos frustrados. O clube dos ricos já existe, mas o “GRUPO DOS DEPRESSIVOS”, não. O “GD” será mais famoso do que o G8. Quero colocar orgulho em se sentir triste a ponto de se autoproclamar um fracassado. Vou fundar, ou melhor, já está fundado o clube dos tristonhos. Neste momento acabo de fundar um clube que não aceita ninguém que tenha feito fotos sorrindo. Nosso objetivo é manter em público, a mesma tristeza que a pessoa expressa quando está sozinho e sabe que não tem de onde tirar dinheiro para pagar as dívidas. 

Nossa equipe de reconhecedores de tristes vai desenvolver um padrão para detectar se o triste está expressando a verdade. Este cuidado deve ser tomado porque existem vários tipos de tristes: o tipo que não passou no ENEM; não foi convidado para as confraternizações; o abandonado pela mulher, inclusive, este último muitas vezes finge tristeza quando na verdade está contente porque a mulher só dava despesa. 

Vai ser muito legal estarmos todos juntos falando do que nos deixa mais tristes, se uma viuvez ou a perda de um filho. Os órfãos, também, estão convidados para fazerem parte do clube. Se ficarem contentes, um só instante, durante a permanência no estabelecimento, será convidado a se retirar. Se com meia hora voltar cabisbaixo, será aceito, mas terá que se explicar.  

Vamos criar um grupo no WhatsApp para que possamos, quando estivermos na madrugada sem dormir, relatar o nosso estado de espírito. Se a pessoa pensa que vai entrar para ver se recebe incentivo para o suicídio, está enganado. Precisamos de sócios famosos pela tristeza: que falam mal de tudo, e de todos; fumam desesperadamente; perdem sono; brigam no trânsito, porque quanto mais tristes, mais teremos influenciadores na irmandade. 

O sorriso nas dependências do clube terá a mesma censura de uma pessoa palitando os dentes num restaurante de luxo. Caso a pessoa queira permanecer rindo, os outros tristes terão motivos suficientes para fazê-lo chorar.      


Heraldo Lins Marinho Dantas

Natal/RN, 17.12.2021  — 17:02



2 comentários:

  1. Boa proposta, Heraldo. (Risos) - Gilberto Cardoso dos Santos

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  2. Por incrível que pareça Leandro Karnal fez uma live ontem,portanto depois que eu havia escrito esta crônica, falando que nesta época do ano todo mundo sente a necessidade de ficar alegre.

    É tipo uma imposição do marketing social...

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