quinta-feira, 18 de novembro de 2021

PIANISTA DE MÃO CHEIA (Homenagem póstuma a Nelson Freire) - Heraldo Lins

 


PIANISTA DE MÃO CHEIA

Como é difícil adentrar ao erudito. Nelson Freire, falecido no dia primeiro de novembro de 2021, representava esse mundo. Com memória grandiosa para a música, elevou o Brasil ao patamar de celeiro de grandes talentos musicais. Vossa majestade, quando se sentava ao piano, trazia milhares de servos para ouvir ordens sonoras ditas de forma impecável. Através dos sons encantava a quem se prontificava a ouvi-lo. Parecia que ele convocava as estrelas a se alinharem para ouvi-lo tocar suavemente, quando necessário, e intenso quando o autor pedia isso nas partituras. 

A vocação e o estudo o fizeram ser uma autoridade na interpretação de peças clássicas. O Brasil perdeu esse grande talento, mas ganhou sua imortalidade. No site da Rádio França, vi sobre ele: “é um monumento, um monstro sagrado do piano que nos deixa”. 

O que faz esse monumento ser pouco lembrado no nosso meio é o planejamento de ações embrutecedoras colocadas em prática. Apenas anotamos os dados sobre sua biografia, mas a essência da música que Nelson interpretava fica para mais tarde. Não se entende a música clássica como se deveria, e isso não é culpa nossa. Há uma fórmula que foge do nosso controle e que serve para nos tornar "atoleimados". Começa pela falta de estímulos no lar. Na escola o que vale é decorar fórmulas e na vida adulta, ganhar dinheiro.

_Quem morreu? 

_Nelson Freire. 

_ Não conhecia!

_Tocava piano.

_ O que é piano?

É assim mesmo que o diálogo se processa, mas saber a resposta das perguntas feitas acima é fácil: só precisa pesquisar e pronto. O maior desafio é gostar do tipo de música que Nelson José Pinto Freire interpretava. Depois entendê-la sem dar sono é outro passo a caminho da evolução musical, e por que não dizer, evolução do ser como um todo. É necessário muito esforço, não só para tocar bem, mas entender as histórias que os sons contam sem usar palavras. Uma história que fala diretamente na alma, ao encadear alegremente uma escala ascendente ou entristecermos nos sons graves e demorados.

 Estamos longe desse patamar de entendimento. Algumas raras exceções compartilham esse deleite, mas nós, a maioria, ficamos observando os âncoras dos telejornais dizerem o que não entendemos. Apenas ouvimos e achamos bonito, e só. 

Acreditamos que é perda de tempo dedicar cinco minutos diários para entender um som e suas relações com nossos sentimentos. Deixamos para nunca, afinal, isso é supérfluo, dizem os desarmados de noção. Há um link abaixo que expressa um pouco como se deve ouvir música. Nesse exemplo podemos contemplar uma das possibilidades traduzidas da quinta sinfonia de Beethoven, peça que Nelson Freire executava com maestria. 


https://youtu.be/aoyw1Yuolfw

 

Heraldo Lins Marinho Dantas

Natal/RN, 15/11/2021 – 15:26


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