CABELOS NA ANTIGUIDADE
Vivemos em uma época de ouro. Depois que inventaram o barbeador e a tesoura, não podemos mais reclamar da vida. Lembro-me do meu pai barbudo comendo carne. O sebo ficava impregnado ao redor da boca que dava nojo. Quando ele comia manga era ainda mais repugnante. Ficava aquele amarelão que parecia muito com o pôr do sol. Teve uma vez que ele resolveu tocar fogo na moita da cara. Aos poucos foi encostando a tocha e os cabelos queimavam-se. Quando o fogo chegava à pele, mergulhava a cara dentro da bacia d’água. Vi também minha avó fazendo isso nas virilhas. Pedia para eu ficar de prontidão com uma cuia d’água na mão. Quando a moita começava a ficar em chamas ela gritava: água meu netinho! Eu dizia: azeite senhora avó.
Minha mãe era outra que lutava contra os cabelos. As tranças debaixo dos braços eram enormes, e ela pedia à vizinha para apará-los utilizando pedras afiadas que a muito custo conseguia deixar o sovaco esfolado. Naquela época era chique criar piolho. O prato indicado era piolho ao molho de barata, e só na ceia de Natal acrescentávamos escorpião. Dormíamos juntos aos animais. Eu gostava de usar uma porca como travesseiro. O desconfortável era dividir seu calor maternal. Não existia psicólogo, e consequentemente, não havia crise existencial. Quando uma pessoa da família morria, servia como alimentação. Lembro-me de um irmão que morreu de picada de cascavel. Matei a cobra e comi os dois. Foi ótimo. Se alguém perguntar como vim para o futuro, explico: mesmo morando em cavernas, cada família possuía uma máquina do tempo.
Heraldo Lins Marinho Dantas (arte-educador)
Natal/RN
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