domingo, 3 de janeiro de 2021

SÍTIO VÁRZEA ALEGRE - Heraldo Lins

 


SÍTIO VÁRZEA ALEGRE

 

 

 

Vaca atolada é negócio difícil de resolver. Nem uma prova de química é tão complicado. Tem que ter trator, corda, e muito cuidado para não arrancar a cabeça da vaca. Se ela for mansa ainda vai, mas uma daquelas que batem no vento, ah! É melhor correr atrás de preá no descampado. A bicha é morrendo e chifrando quem se aproxima. Com muita sorte se consegue salvá-la. Depois de tirá-la é melhor montar no trator senão ela vem para cima. Só teme quem cuida dela. Se outro se arriscar, leva chifrada.

 

Apesar de aparentemente calma, a vida no sítio é agitadíssima. Cheia de afazeres. O sitiante está repousando depois do almoço, sol de rachar até taboca verde, aí o vizinho chega com a notícia. O seu gado entrou na minha vazante. Lá se vai tanger o gado de volta. Quando volta já nem consegue descansar. É hora do café com bolacha seca. Molhada no leite? Só à noite no jantar. Se quiser pode ser leite com cuscuz, ou coalhada com rapadura. Mas à tarde, é seca, para combinar com o clima semiárido.

 

Depois do café da tarde, vai-se queimar coivara para fazer o plantio que as chuvas não demoram a chegar. No descampado há uma farra de meninos avisados da missão: pegar os preás na carreira. Toca-se fogo no amontoado de gravetos secos e espera-se o preá correr. Quando ele correr vai ser naquela direção. Prestem atenção! Eu toco fogo e vocês esperam ele espirrar. Bote o pé atrás que é fácil. Dois minutos depois um preá sai em disparada. A ruma de meninos correndo atrás desse preá provoca risos. O avô fica gargalhando enquanto o preá corre desviando-se das pauladas. O primeiro consegue escapar. Quando voltamos, antes de chegar perto do fogo, mais um sai correndo. Reinicia-se a gritaria. Esse movimento prossegue a tarde toda, e nada de pegar sequer um. Passados os anos é que um dos meninos corredores descobre que jamais iriam pegar um preá na carreira. O avô fazia isso só para se divertir com os netos. Ele gostava dessas presepadas. Quando não tinha neto por perto, divertia-se arrancando o rabo dos anuns. Dentro do sítio os pássaros eram quase todos cotós. Não precisava muito esforço para fazer isso. Ficava limpando mato. Os anuns, atrás dos insetos descobertos pela enxada, aproximavam-se o bastante. No descuido eram pegos e em seguida soltos sem o rabo. A vizinhança já sabia. Lá vai mais uma vítima de seu Teno.        

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Heraldo Lins Marinho Dantas (arte-educador)

Natal/RN, 28/12/2020 – 16:55

showdemamulengos@gmail.com

84-99973-4114

 

 

 

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