SÍTIO
VÁRZEA ALEGRE
Vaca atolada é negócio difícil de resolver. Nem uma
prova de química é tão complicado. Tem que ter trator, corda, e muito cuidado
para não arrancar a cabeça da vaca. Se ela for mansa ainda vai, mas uma
daquelas que batem no vento, ah! É melhor correr atrás de preá no descampado. A
bicha é morrendo e chifrando quem se aproxima. Com muita sorte se consegue
salvá-la. Depois de tirá-la é melhor montar no trator senão ela vem para cima.
Só teme quem cuida dela. Se outro se arriscar, leva chifrada.
Apesar de aparentemente calma, a vida no sítio é
agitadíssima. Cheia de afazeres. O sitiante está repousando depois do almoço,
sol de rachar até taboca verde, aí o vizinho chega com a notícia. O seu gado
entrou na minha vazante. Lá se vai tanger o gado de volta. Quando volta já nem
consegue descansar. É hora do café com bolacha seca. Molhada no leite? Só à
noite no jantar. Se quiser pode ser leite com cuscuz, ou coalhada com rapadura.
Mas à tarde, é seca, para combinar com o clima semiárido.
Depois do café da tarde, vai-se queimar coivara para
fazer o plantio que as chuvas não demoram a chegar. No descampado há uma farra
de meninos avisados da missão: pegar os preás na carreira. Toca-se fogo no
amontoado de gravetos secos e espera-se o preá correr. Quando ele correr vai
ser naquela direção. Prestem atenção! Eu toco fogo e vocês esperam ele
espirrar. Bote o pé atrás que é fácil. Dois minutos depois um preá sai em
disparada. A ruma de meninos correndo atrás desse preá provoca risos. O avô
fica gargalhando enquanto o preá corre desviando-se das pauladas. O primeiro
consegue escapar. Quando voltamos, antes de chegar perto do fogo, mais um sai
correndo. Reinicia-se a gritaria. Esse movimento prossegue a tarde toda, e nada
de pegar sequer um. Passados os anos é que um dos meninos corredores descobre
que jamais iriam pegar um preá na carreira. O avô fazia isso só para se
divertir com os netos. Ele gostava dessas presepadas. Quando não tinha neto por
perto, divertia-se arrancando o rabo dos anuns. Dentro do sítio os pássaros eram
quase todos cotós. Não precisava muito esforço para fazer isso. Ficava limpando
mato. Os anuns, atrás dos insetos descobertos pela enxada, aproximavam-se o
bastante. No descuido eram pegos e em seguida soltos sem o rabo. A vizinhança
já sabia. Lá vai mais uma vítima de seu Teno.
.
Heraldo Lins
Marinho Dantas (arte-educador)
Natal/RN,
28/12/2020 – 16:55
84-99973-4114
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