ESTADO AVÓ
Como ser mãe, não existe ex-filha e nem ex-avó. Ser avó é um estado
permanente e eterno. Ainda estou tentando entender essa novidade. E, ao mesmo
tempo, descobrindo um amor incomensurável, incontável, incontrolável!
Ser vó é o estado mãe aprimorado. Não tem enjoos, vômitos e mijadeiras
no meio da noite. Não tem o efeito estufa do bucho crescendo. Não tem o pavor
das possíveis estrias e nem a maratona para perder os quilos acumulados. Tampouco as dores do parto e a buceta se rasgando, explodindo vida pulsante, que é
divino, porém doloroso.
No Estado Vó não tem o rigor de ensinar como sentar, andar e comer, e também
o de mostrar as tais “boas maneiras”, ensinar palavras mágicas, como licença, desculpe,
por favor e obrigada ou preparar a criança para identificar abuso físico,
mental e pedofilia. A vovó faz tudo isso, mas sem a pressão agendada de ter que
fazer.
Ser avó é como se a mulher fosse uma jogadora de um time, no entanto,
reserva. Só entra em campo se acontecer uma falta perigosa e a titular se
machucar. No teatro tem nome inglês, stand in. A stand in, a substituta, só
entra em cena em caso de impossibilidade total da dona da posição.
É um amor que mora no peito, mas não pesa e nem aperta o coração. Não dá
cabelos brancos e nem rugas na testa. A filha já presenteou tudo isso. É um
amor somente responsável pelo milagre de renascer no novo. É renascer amando
sem se dar conta desse amor descomunal.
Ser avó é simples. É somente uma avalanche, um terremoto e um tsunami em
cadeia e ao mesmo tempo. É um amor de se perder. Perder os sentidos, o senso e
até o juízo.
É enxergar a esperança na esquina e criar futuro. É virar cambalhota,
pular como Saci, imitar marreco e cantar o Pato; aprender o código da amizade,
brincando ao som de Amigos do Peito e voar no Balão Mágico, cantando Super
Fantástico. É nadar de novo no mar da Pequena Sereia e lembrar que o Hans
Christian escreveu; é revisitar os Irmãos Grimm, suas fadas, bruxas e
princesas; é cair novamente no mundo de Alice e, por alguns minutos, acreditar
que ele é real. É aprender letras de canções como Aquarela, Tarde em Itapoã e
Sino da Igrejinha somente porque elas ensinam alguma coisa à querubim. É fazer
corrida de cobra, de sapo e de pinguim.
Caramba, tô ficando maluca! Cadê o meu juízo que tava aqui agorinha
mesmo? Correu? Fugiu? Se perdeu? Ai, volte, por favor! Sou uma senhora
sessentona, preciso de você, juizinho querido!
Tô procurando esse danado pingente-pêndulo chamado juízo. Colei cartazes
na cidade, anunciei em todas as minhas redes sociais, e nada. Ninguém sabe,
ninguém viu. Perdi. Perdi o pouco juízo que tinha. Agora, a netinha me chama de
vovó Malukinha. Se o apelido pegar, o netinho também assim vai me chamar!
…Kinha Costa……
Atriz premiada, cronista, arte-educadora, repórter, reside na África do Sul.
Livros publicados: “Copa do Mundo – de Riachuelo a Johanesburgo”, “África do Sul: Um olhar brasileiro”, “Impressões de uma Matuta: Aventuras de uma brasileira nos países baixos” e “Duas corujas e um gato” (infantil).
Muito boa crônica. Parabéns. Veio do coração. Esta está eleita. Obrigado...
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