O Poeta e o Tempo
Tempo e poesia se combinam muito
bem, uma imbricação perfeita! O poeta e o tempo Inebriam a todos versando em
poesia um diálogo majestoso. O poeta tenta colocar no tempo os versos que no
seu tempo cabem, e o tempo finge adaptar-se ao poeta e aos seus versos e até
sorri. Vejamos então o Aldir Blanc, com
a canção intitulada - Resposta ao Tempo: ”ouvi batidas na porta da frente é o
tempo”. Depois de um lindo diálogo, inicialmente tímido, Aldir dá a volta no
tempo. Imaginem só, o tempo se corrói com inveja de mim, disse o poeta. E
concluiu: no fundo é uma eterna criança que não soube amadurecer, eu posso, ele
não vai poder me esquecer. No tempo de Aldir, os acontecimentos adormecem,
perdem a sua dinâmica, enrijecem, ficam aprisionados, o tempo vigia querendo aprender,
e ele, o poeta, se liberta, desperta, morre de amor, passeia no tempo.
“Por seres tão inventivo e
pareceres continuo tempo, tempo, tempo, tempo és um dos deuses mais lindos
tempo, tempo, tempo, tempo” (Caetano Veloso), Oração ao Tempo. Nos versos do
poeta percebe-se uma rendição completa ao senhor tempo! Espelho do filho,
compositor de destinos, inventivo, belo, movimento preciso, confidente. O tempo
é passado e presente, senhor e criança, tempo contínuo e reflexo.
Em Tempo Rei, Gilberto Gil não se
ilude: não me iludo/ tudo permanecerá do jeito que tem sido/ transcorrendo/
transformando. O tempo se associa ao
espaço e navega em todos os sentidos, tem o poder de transformar as velhas
formas do viver. Tudo poderá estar por um segundo, sabedoria dada pelo tempo,
sabedoria das mães velhas, uma interação do homem com o tempo.
Em tempos de pandemia, como
estamos lidando com o tempo? Fazendo um paralelo entre o sol e o tempo, me vem
o sentido de movimento atrelado ao sol. Ele nasce, fica alto, fica baixo, se
põe! Quando de fato, o sol continua inerte. Todos esses movimentos são
imaginários e necessários ao nosso cotidiano. “O sol que atravessa essa estrada
que nunca passou” (Caetano Veloso). Quem atravessa a estrada somos nós, o sol
nos observa. O sol está tão presente e altivo que confundimos nossos
movimentos, atribuindo-lhe funções que não são suas. O sol se apresenta para
nós também como referencial de tempo e localização. “Um galo sozinho não tece
uma manhã”- tudo é uma questão de crença, um galo precisa confiar no outro.
Minha filha quando criança, sentia dificuldade de entender o significado da
palavra amanhã. “Amanhã é quando eu dormir?” isso mesmo, amanhã é quando você
dormir! É difícil explicar para uma criança que não existe amanhã. O amanhã será
sempre uma incógnita, hoje mais que nunca. Assim como o sol, o tempo também
adquire mobilidade no nosso dia a dia. O tempo é passado, é presente e é
futuro, esses são também os tempos do verbo. Conjuguemos.
O cantor, compositor e músico
Belchior, em seus versos, nos faz lembrar que “o novo sempre vem” e Lulu Santos
nos adverte que “nada será de novo do jeito que já foi um dia”. Recordo-me de meses atrás lendo um comunicado
para os pais, estava escrito: não é permitido uso de celular em sala de aula.
Apesar desse comunicado, os alunos sempre resistiram, eles estão no tempo
presente! Hoje, imploramos para que esses mesmos alunos se utilizem de seus
celulares para exatamente terem as aulas que o tempo presente exige e
interagirem com seus professores. Parabéns, estudantes. Vocês são de vanguarda,
rebeldia necessária. Cada um conjuga o verbo no seu tempo, essa é a era das
novas tecnologias. Nós, me refiro à maioria dos educadores, estávamos no tempo
passado. O passado tem a sua importância, mas também aprisiona. Estejamos
atentos para perceber quando o “passado é uma roupa que não nos cabe mais”.
Na reinvenção da escola para as
necessidades do tempo presente, em nenhum momento foi questionada a capacidade
de adaptação do estudante. Questionou-se outros aspectos, como: acesso à
internet, um computador que respondesse a suas demandas, um espaço físico
adequado para a aprendizagem. Enquanto do outro lado, foi necessária uma
adaptação, uma capacitação para uma adequação satisfatória à pedagogia digital.
São apenas constatações que merecem algumas reflexões sobre o tempo do
outro.
Nesse período de distanciamento
social ouve-se muito, em relação ao tempo, a ideia de paralisação, modo avião,
stand by. A percepção do tempo é muito particular, mas uma coisa é certa, o tempo
não para e nem espera, mesmo numa pandemia. Cabe a cada um de nós ressignificar
o nosso tempo, tirar o pé do atoleiro, dialogar com as pessoas do presente, a
palavra é: conexão. O tempo é histórico, não existe tempo melhor ou pior,
existe o tempo para ser percebido e ser vivido.
No tempo presente, aparentemente
adormecido, muito está sendo feito, uma verdadeira ebulição. As pessoas estão
remontando o seu tempo e seus projetos de vida. Passado o período pandêmico e
consequentemente vier o despertar, perceberemos o quão adiante estamos. Com
qual velocidade iremos nos movimentar para acompanhar esse tempo, uma
correnteza submersa? Fazendo uma releitura de Mateus 16:25, aquele que se
fechar no tempo para justificar os seus atos atrelados ao passado perderá o
bondinho da vez e amargará a desilusão pelo equívoco de achar que é senhor do
seu tempo, será tragado por não compreender essa dialética. “Todos os dias/
antes de dormir/ lembro e esqueço/ como foi o dia/ sempre em frente/ não temos
tempo a perder” (Renato Russo).
Que lindo!!!! Houve um deleite por aq... literalmente em ebulição como você mesma falou. Parabéns pelas belíssimas palavras! 👏👏👏👏👏
ResponderExcluirMuito obrigada!
ResponderExcluirExtraordinário texto; lucidez, filosofia, poesia, espiritualidade, com apurada epistemologia de incentivo ao enfrentamento da realidade com inteligência e capacidade inventiva. Excelente, ilustre professora Maria Goretti
ResponderExcluirMuito obrigada, ilustre professor!
ResponderExcluirMaria Goretti Borges, o seu texto o Poeta e o Tempo é primoroso. Sugiro que tente publicá-lo na Tribuna do Norte. Merece ser lido por muitos! Você filosofa cantando e é muito bom ouvir e meditar em cada palavra!
ResponderExcluirMuito obrigada, Marcos!
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