Solicitei à excelente educadora Luzia que escrevesse suas memórias de leitura e o resultado foi maravilhoso! A começar do título, o texto já nos encanta! A leitura se dá pelo exemplo, pelo contágio. Espero que este testemunho de amor pelos livros cumpra importante papel neste país de analfabetos funcionais.
Inspirado na foto e no exemplo de vida que ela tem dado, eu digo:
Luzia é luz, alegria
altruísmo, poesia
Roseiral em floração
Bem que Drummond já dizia
Que uma Pessoa "Luzia
Na janela do sobradão".
A insustentável leveza de ler
É mister reconhecer que a leitura é um hábito que podemos adquirir.
Lemos por prazer, para estudar e para nos informar.
Como me tornei leitora? Fiquei pensando na minha trajetória e como
adentrei nesse mundo de encantos e fantasias. Através da leitura, já andei o
mundo inteiro com os pés no chão e a cabeça nas estrelas. Aprendi a ler antes
de ir para a escola. Não era algo extraordinário esse feito. Era algo natural
nos idos anos 70. A minha mãe tinha amor pelos livros, revistas e novelas
radiadas. Minhas irmãs leitoras assíduas de fotonovelas. Gêneros extintos. As
novelas de rádio eram espécies podcasts sequenciados.
Meus irmãos liam folhetos de bolso cuja temática era faroeste, revista
Tex e Zagor. As bancas vendiam revistas Capricho e Sétimo
Céu. Esta preto e branco, aquela em cores. Eram semanais e fisionômicas
aos mangás, preservando as características, eram modismo como as
séries contemporâneas.
Todo mundo do meu mundo lia por escambo, empréstimos. Nunca soube
quem comprava livros como Christiane
F, Com Licença , Eu Vou à Luta, Pássaros Feridos, Papillon, Perdidos Na Noite,
Laços De Ternura, O Lobo da Estepe, Fernão Capelo Gaivota, Ninguém É De
Ninguém, 79 Parq Avenue, As Sandálias Do Pescador, Complexo de Cinderela,
Síndrome de Peter Pan, A Queda Para o Alto, A Carícia do Vento, Enterrem
Meu Coração Na Curva De Um Rio, Ainda Resta Uma Esperança, Horizonte
Perdido... Além da grande maioria dos clássicos da Literatura Brasileira e
da Literatura Universal que eu li na minha infância e adolescência.
Possuía a dádiva de ser vizinha da biblioteca municipal. Era comum
doadores deixarem livros na minha casa quando a biblioteca estava fechada. Foi
numa ocasião dessas que conheci Clarice Lispector...tive estranhamento. Diria
um "supapo", um "catabilho”. Não tínhamos dinheiro para comprar livros,
mas eles surgiam. Meu pai falava muito em São Saruê e, naquela época,
certamente era de lá que eu colhia, no pé de livros, essas maravilhas. Foi com
grande espanto que na faculdade estudei a terra prometida que meu pai, que não
sabia ler, tanto me falava.
O livro Cem Anos de Solidão
era tão centenário quando chegou lá em casa que colecionei as traças que
comeram a palavra: Macondo. Eu li: "Muitos anos depois, diante do pelotão de fuzilamento, o Coronel
Aureliano Buendía havia de recordar aquela tarde remota em que seu pai o levou
para conhecer o gelo. Macondo (Nome
que a traça comeu) era então uma aldeia
de vinte casas de barro e taquara, construídas à margem de um rio de águas diáfanas
que se precipitavam por um leito de pedras polidas, brancas e enormes como ovos
pré-históricos. O mundo era tão recente que muitas coisas careciam de nome e
para mencioná-las se precisava apontar com o dedo(...)"
Deixo aqui nesses
escritos a recomendação, quase que um dever, dessa leitura de Gabriel García
Márquez.
Entrei no curso de Letras por amor aos livros. Lá conheci
James Joyce, André Gide, Dostoievski (demorei para saber pronunciar),
Goethe (ainda não sei falar direito esse nome) Oscar Wilde traduzido por
Clarice, Florbela Espanca, Rosa e Pessoa. São tantos...e eu tão pouca. O poeta
tem razão. É vã lutar com as palavras...sou pacífica com elas.
Das revistas em quadrinhos até Adélia Prado e O Homem Da Mão Seca tem sido um longo caminho. No ofício de
professora leio muito, porém tenho sentido falta da leitura por fruição.
Tenho feito leituras obrigatórias, textos curtos, livros didáticos. Este ano li
o primeiro volume de uma ficção dos anos 80. Uma distopia apócrifa e uma
biografia. Ganhei livros e dei livros. Adquiri um leitor digital, um Lev. A
promessa é de armazenar 8 mil livros. É preciso não ter como absurdo o novo,
mas nada se compara ao livro físico...faz parte da gente sentir texturas e
cheiros. É uma necessidade sinestésica.
A leitura é o único mecanismo que nos tira dessa dura realidade. Não sou
purista. Li alguns cânones, Júlias e Sabrinas e todos me constituíram e me
constituem como leitora. Leio, sem
cesurar, posts diversos nas redes sociais, pois
concebo como valioso todo ponto
de partida ou de chegada para a leitura que sempre estará lá... espreitando e
acontecendo, bendita ou (mal)dita. Tenho admiração pela
inspiração dos escritores, gosto da forma como os livros tocam a imaginação e o
coração das pessoas. Por fim, leia. Leia para se salvar da caminhadura. Leia
porque os livros são maquinas de transformações, janelas do mundo. Aceite o
conselho de Voltaire: leia porque a
leitura engrandece a alma.
Quando ela me questionava a respeito do eu lírico, eu já desconfiava: estava dentro dela, como um "encosto", uma Luz. Conheço de longe um bom leitor. Desde o século passado. E quando os conheço, não os deixo ir embora nunca. Principalmente quando este nunca está entre Macondo e São Saruê.
ResponderExcluirÀ mestre com carinho
ExcluirQuem teve e tem uma professora
chamada Val...tem uma espécie de dever com o sagrado coração de todos os escritores do mundo. Amo-te e amar-te-ei para além desta vida.
É...Luz...de...Luz, assim se encontram entre letras, palavras e sons!!
ResponderExcluir🌻
ExcluirQuando lhe digo: "continue, Cumade", nesse tom de cotidiana linguagem corrente, cheia de asas como meus passqrinhos surreais e imaginários, ela me diz como respista: "Cumade, eu só sei costurar palavras!". Eu pergunto ao leitor "se existe algo mais substancial que o ofício de costurar, desmanchar, costurar de novo e compor um tecido feito todinho de palavra". Não, a palvra lida e escrita é o nosso alimento diário, a nossa fonte existencial. Luzia Pessoa é inganávelmente um talento potiguar.
ResponderExcluir"Cumadi", quão grande és tu! Vejo hora, qualquer dia, quando "dé fé" , eu acreditar
ExcluirE assim, a leitura instiga a imaginação, aumenta o vocabulário, faz desabrochar novos escritores. Com Luzia não foi diferente: pegou as palavras no laço, domesticou-as e, com elas, vai crochetando sem errar um ponto, construindo significados, às vezes irreverentes, outras engraçados. Um ser luz, assim reluz, Luzia!
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