quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Só retirem os coletes depois que estiverem em segurança - Francisco Maciel



A frase que me deu o título do texto foi a que ouvi de um guia turístico do Barco-Escola Chama-Maré, uma das ações educativas desenvolvidas pelo Programa Potengi Vivo, do Instituto de Defesa do Meio Ambiente do Rio Grande do Norte – IDEMA. Foi em passeio-aula no rio potengi que alunos e alguns professores da Escola Estadual Severina Pontes de Medeiros realizamos ali: isso mesmo: só retirem os coletes depois que estiverem em segurança. Em seguida foi que entramos no ônibus escolar e de volta viajamos. Entretanto, observei que desta vez sem segurança, pois, sem cinto. E assim foi na rodovia, embora três cintos em cada assento e no painel do ônibus um aviso: Lotação: 48 passageiros sentados.
Éramos pouco mais de trinta que... Se nos submetemos às exigências de locomoção no mar, por que não diante das exigências de locomoção em terra? Na ida, a bem da verdade, eu usei o cinto e na volta; até para ser mais justo aqui, porque esse texto começou a nascer por lá; tentei buscá-lo, mas desconfio de que a pessoa que estava do meu lado sentou em cima dele. Se foi assim, acho que muito mais a incomodava, além de me ser inútil: eu não consegui encontrá-lo e não fui capaz de importuná-la. Sinceramente, somente agora me sinto à vontade pra falar sobre isso.
Foi o guia turístico do barco quem conseguiu em seu território que o estrangeiro se submetesse às suas regras, ficando claro quem mandava ali. De nossa parte pareceu sujeição mesmo, obediência incondicional e não um ato voluntário, consciente ou espontâneo, pois não teve sequência adiante. É assim que outro dia estive pensando nos JERNs, jogos estudantis que são competições envolvendo escolas de outros municípios do estado. Cada jogo possui suas regras e não tenho conhecimento de aluno agindo com leviandade e com menosprezo, ou à revelia para com as decisões da arbitragem, a despeito do que acontece em nosso restrito e “democrático” espaço escolar, extensivo ao ônibus escolar e à vida. Mas, enfim, também não é só isso.
Acompanhei noutros tempos jovens da igreja em que me congregava, num congresso evangelístico em que éramos dez ou doze para dormir numa sala. Em meio à dificuldade para que se fizesse silêncio, e há também lei do silêncio, fiz sob a atenção de todos uma oração, assumindo diante de Deus o compromisso de que a partir daquele momento haveríamos de reverentemente nos calar, em reconhecimento às horas sagradas que para nós passara a ser também especial e para que em respeito de um para com o outro pudéssemos ter uma noite de sono reparador. Todos nos juntamos na cumplicidade de um amém bem fervoroso, o que não fez diferença e que nem por isso houve mudança de comportamento a partir dali.
Na outra casa em que morei, certa vez um menino importunava com um patinete na calçada do beco que eu dividia com a Escola Estadual Severina Pontes de Medeiros, ainda mais ao meio-dia. Conversei com ele e o convenci a sair dali. Em seguida o vi ainda próximo conversando com sua mãe, até que decidiu voltar. Perguntei-lhe sobre o que acontecera: _Mãe disse que aqui é público!
Foi meu filho quem me contou que certo dia viu na rodoviária de Santa Cruz um grupo de estudantes sentados sobre livros, cujas camisetas que usavam lhes imputavam ainda mais um agravante: eram estudantes do curso de pedagogia. São exemplos que se somam nos dando a dimensão do contexto, sendo eu apenas peça de parte dessa engrenagem, sem querer aqui parecer moralista, nem que tenha o intento de sentir-se à parte, acima, ou de me excluir disso tudo, pois, até mais que isso, sinceramente, eu sinto...
Sinto por a mãe que citei, na sua incapacidade de explicar para o filho que o espaço da calçada daquela escola é público sim, só que público para se zelar, público para se cuidar também. Sinto se o curso de licenciatura não começou para findar conscientizando futuros profissionais da educação quanto ao fato de que livro é símbolo de conhecimento, de sabedoria e que merece mais é ser reverenciado. Sinto pelas lacunas presentes no que deve ser educação enquanto que dever da família e do Estado. Sinto por não sermos conscientes, ainda, o suficiente para fazermos uso devido e óbvio daquilo que estar ao nosso alcance, com a sensibilidade e a conscientização crítica necessária, sem parecermos indiferentes àquilo que nos faz bem. Sinto, enfim, assim, na expectativa pela existência sempre de um suposto momento adequado para que retiremos os coletes e de maneira consequente e consciente, o mesmo façamos em relação aos cintos.
E enquanto isso, por esse culto ao bem e com a autoridade de que meu texto me reveste, é que sentencio daqui, no que me refiro ao uso do cinto em questão: “Deixemos de coisa /Cuidemos da vida/ Pois se não chega a morte / Ou coisa parecida/ E nos arrasta moço/ Sem ter visto a vida.”(Raimundo Fagner).
Prof. Maciel. Japi/RN





O convite acima refere-se a você, querido leitor, e é extensivo a seus familiares. Todos os que quiserem colaborar sintam-se à vontade para repassar este convite. 
A cultura nordestina e a APOESC  agradecem a todos que de algum modo têm nos ajudado.

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