terça-feira, 31 de janeiro de 2023

ESTÁGIO VOCACIONAL - Heraldo Lins

 


ESTÁGIO VOCACIONAL 


Mistura de raiva com outros sentimentos o fez ficar acordado pensando na “facãozada” que ensaiou no pescoço da mulher. Era de brincadeira, porém precisava tomar coragem para fazer de “vera”. De tanto ler e assistir filmes aterrorizantes, começou a pensar dentro desse quadrado. Hitler, Mussolini e até o juízo final eram os temas preferidos. Pensava nas mais severas atrocidades sem se dar conta que a cultura do sangue estava sendo por ele absorvida. 

Foi regar as plantas para fixar bem a vontade de enveredar para o clube dos seriais killers. No início, tinha pouca vocação para o mal, entretanto, de tanto ver que nos canais abertos a audiência aumentava quando o programa mostrava cenas de violência, começou a pensar que esse era o único caminho para conseguir visibilidade.  

Covarde por sua natureza esquizofrênica,  procurou se adaptar de forma lenta, porém eficiente, e para isso começou jogando uma lagarta em cima de um formigueiro; arrancou as penas de um pássaro vivo e o deixou correndo para longe dos gatos que brincavam com aquela refeição.

Entrava em êxtase quando podia decidir o destino de um ser vivo. Fez uma guilhotina para ratos, ampliando para gatos chegando aos cães. Seu grande projeto foi uma para jumentos. A lâmina tinha que ter algumas toneladas a mais para separar, de um só golpe, a cabeça do resto do corpo de um touro. 

Enquanto estava construindo essas ferramentas, nem um minuto sequer conseguia ficar triste. Sabia que esse hobby tinha que ser praticado com ampla divulgação, pois seu desvio de personalidade deveria chegar ao maior número de loucos possíveis. Construiu um viveiro para borboletas e inseriu um fungo na ração só para se divertir vendo-as debaterem-se numa tremenda agitação sem escapatória. 

Do outro lado do rio, algumas pessoas viviam na mais pacata harmonia com a natureza. Não tinham televisão, internet nem poluição. Tudo que produziam era dividido, além de terem o conhecimento milenar de extrair substâncias curativas do ambiente florestal. 

Do lado de cá, os campos de concentração eram estudados com suas variadas formas de flagelo animal, até que a manifestação maldosa tomou corpo. Muitos juntaram-se e isso o fez isolar os do lado de lá somente para vê-los transformados em zumbis modernos, argumentando que os ricos e famosos não precisariam ir à África para buscar filhos adotivos, já que a nação produziria suas próprias aberrações humanas. 


Heraldo Lins Marinho Dantas

Natal/RN, 31.01.2023-16h56min



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