UMA TARDE DE SAUDADE
(Maciel Souza – 06/02/2017)
(Maciel Souza – 06/02/2017)
Acadêmico da vida, surpreendia-me com suas tantas informações, seu discernimento, sua capacidade argumentativa e de interpretação. Quanto a sua personalidade era um misto de afago e intolerância, abraço e repulsa, compreensão e incompreensão, com transparência e lucidez. Honesto, cumpridor dos seus deveres e sem nenhuma surpresa de falsidade. Era terreno em que todos sabiam onde pisavam, com quem estavam lidando. Algumas vezes fui por ele repreendido e vez por outra, acalentado: Você pra mim é como um filho! E havia entre tantos aqueles que me diziam: Expedito gosta muito de você! Amava os filhos, amava os netos e minha neta: Maciel, essa menina foi a melhor coisa na tua vida! Sem esconder que tinha um carinho diferenciado por Fernanda e Davi.
Em nosso primeiro contato eu estava vindo de Santa Cruz para Japi e ele com seu carro quebrado na estrada. Ofereci ajuda que dispensou, agradecido, não sem antes perguntar se eu queria comprar jaca. Sereno na adversidade, desinteressado em explorar a boa vontade alheia e comerciante nato. Isso mesmo: Expedito Pinheiro Gomes, agora com todas as letras e a cara lavada de suor por um sol angustiante, no mormaço do asfalto de quase meio dia, quando lançou assim do imprevisível a tentativa de vender “seu peixe”: Quer comprar jaca? Neste aspecto fazia jus ao significado do seu nome de guerra para as batalhas da vida, Spedito, em italiano, que significa enviado ou rápido e ainda desembaraçado, hábil, diligente; acrescido, ainda, do que me lembrou o seu amigo Fabinho da EMATER, já sentindo a sua ausência: Ele tinha consigo sempre o bom humor!
Dos lamentos de Fabinho, eu deveria também mais vezes ter ido ao sítio para estar com seu Expedito, afinal, receber os amigos era do que mais gostava, sem abrir mão dos afazeres entre uma prosa e outra. Era pra termos dedicado mais do nosso pouco tempo às nossas conversas naquelas tardes, no alpendre daquela casa; tardes que agora se voltam contra nós: “Porque quando a tarde vem é a hora mais aflita, mais negra, mais esquisita, pra quem recorda de alguém”. Otacílio Batista. Verdadeiramente dá pra sentir o quanto era bom chegar em casa e escutar Adriana dizer que seu Expedito trouxe feijão verde! Que seu Expedito trouxe jerimum! Que seu Expedito trouxe acerola! Que seu Expedito disse que domingo o almoço seria lá no sítio! Que Seu Expedito passou e deixou uma jaca... pra mim! Foram tantas as jacas mais saborosas que já comi em toda minha vida, sem nunca ter lhe comprado uma sequer.
Para o almoço no dia de natal fui convidado havia mais de vinte dias: Não me falte! Mas não fui. Mamãe reuniu os seus filhos na mesma data e já com seus setenta e três anos, dois dias depois seria submetida a uma cirurgia. No dia seguinte fui ao sítio pedir desculpas e ouvir dele que perdi a maior festa que já tinha realizado. Esta foi a última vez em que nos vimos e a partir dali contei por ele somente mais quinze dias. Ao despedir-nos me serviu um copo d’agua e saí saciado como todas às vezes quando lá estive, ainda mais porque naquele dia compartilhei problemas de minha vida pessoal, pois é assim que os amigos fazem: “Em todo tempo ama o amigo e na angústia se faz o irmão." Provérbios 17:17.
Seu Expedito que me deu tanto de sua atenção, de seu trabalho, de seu tempo, por último me deu ainda mais de sua água, água símbolo de vida, vida que deve ser celebrada, se por mais que a separação seja dolorida, pois deleitoso é dormir, descansar das fadigas e por último acordar no Senhor, com a promessa de que não mais haverá uma tarde como esta. Refiro-me às tardes que para mim são de saudade.
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