DESPEDIDA INESQUECÍVEL
I
Vou deixar esta fazenda
Onde fiz a minha história
Vida humilde e simplória
É bom que o leitor entenda
Se vivi de sua renda
Por que agora parar?
Preciso mesmo explicar
Quais os principais motivos
Que foram tão decisivos
Ao ponto de me mudar.
II
Foi aí que eu nasci
Foi aqui que me criei
Fui embora mas voltei
Só pra vir morar aqui
Com o tempo envelheci
Na velha propriedade
Mas não foi só a idade
Que mudou a minha história
Daquele tempo de glória
Resta somente a saudade.
III
Não dava pra me manter
Sem arcar com as despesas
Pra viver de incertezas
Achei melhor te vender
Muito embora sem querer
Essa é a pura verdade
Irei curtir a saudade
Desse pedaço de chão
Nas ruas do Pachacão
Num recanto da cidade.
IV
Mas uma das consequências
Que me obrigaram a partir
Pra não ter que reagir
Diante das violências
Não combino com tendências
Que abalam a confiança
Faz sumir a esperança
De pessoas como eu
Que deixa o lugar que nasceu
Por falta de segurança.
V
Hoje nas propriedades
Só se vê casas vazias
E nas estradas as romarias
Do pessoal pras cidades
Vão passar necessidades
Porque não arranjam emprego
Deixam o seu aconchego
E os costumes da roça
Pra ir morar em palhoça
A fim de encontrar sossego.
VI
Não dá mais pra se viver
Numa região pacata
Sentir o cheiro da mata
Sem ter que se precaver
Não tem direito ao lazer
Nem morar não pode mais
No lugar onde seus pais
Foram nascidos e criados
Porque são escorraçados
Por ordens dos marginais.
VII
Que nossos legisladores
Aprovem leis mais severas
Para punir estas feras
Que agridem os trabalhadores
E fiquem sabendo os senhores
Que este bravo camponês
Convive com a escassez
Da mais tenebrosa gruta
Pra extrair da terra bruta
O sustento de vocês.
VIII
Este homem simboliza
A riqueza do país
Mas não pode ser feliz
Será que ele não precisa?
Quando compra uma camisa
A outra já está rasgada
Seu lazer é a enxada
E cuidar da agricultura
Ainda sofre censura
E não ganha quase nada.
IX
Sabe quando é enxergado?
Em épocas de eleições
Sai de lá dos socavões
Pra votar é convocado
E poderá ser multado
Se não comparecer à sessão
Não tem direito ao perdão
E nem tampouco à anistia
Cadê a democracia?
Eu quero uma explicação.
X
Enquanto a agricultura
Está ficando abandonada
Tanta terra desprezada
Onde antes era fartura
Não se vê uma viatura
Protegendo o pessoal
O medo do marginal
Faz o camponês matuto
Abandonar seu reduto
E deixar a zona rural.
XI
Tem que arranjar serviços
Pra esses presidiários
Que os conselhos estatutários
Dê a eles os compromissos
Para não ficarem omissos
Precisam de trabalharem
Para eles não ficarem
Planejando novos crimes
Vão adotarem regimes
De auto se sustentarem.
XII
Só havendo essas mudanças
O indivíduo desiste
Esquece este lado triste
Se esquiva das matanças
Vai ter amor às crianças
Vai ser mais sentimental
Só assim o pessoal
Deixam as periferias
E vê-se as mesmas romarias
Voltando à zona rural.
Autor: JOSELITO FONSECA DE MACEDO, vulgo, DAXINHA.
15/06/2005
JOSELITO FONSECA DE MACEDO, mais conhecido como poeta Daxinha, nasceu em Cuité/PB, em 14/08/1938. Filho de José Adelino de Macedo e Maria Marieta da Fonseca, nasceu na zona rural de Cuité, mais precisamente no Sítio Boa Vista do Cais, popularmente conhecido como Sítio Pelado. Aos 20 anos, viajou para os estados de Minas Gerais e Goiás, onde trabalhou como agricultor e vaqueiro. Mas foi no estado de São Paulo que se fixou, trabalhando como metalúrgico nas principais usinas siderúrgicas da região do ABC paulista. Retorna à Paraíba em 1985, retomando suas funções de agricultor. Sempre gostou de poesia, sobretudo, do gênero cordel no qual, ainda menino, já escrevia seus primeiros versos. O retorno a Cuité aproximou-o ainda mais de suas raízes, fazendo-o mergulhar com mais fervor no mundo da poesia. Sempre convidado a se apresentar em eventos culturais da cidade, seus versos focavam, principalmente, no cotidiano das pessoas simples – como ele mesmo o era. Tem como obras publicadas um CD de poesias intitulado: “Poeta Daxinha – Um Amante da Poesia”, o cordel “O batente de pau do casarão” e uma participação póstuma no livro “APOESC em Prosa e Verso”, do também poeta Gilberto Cardoso dos Santos. Casado, pai, avô e bisavô, o poeta Daxinha faleceu em 04/05/2016, em Campina Grande/PB, vítima de insuficiência cardiorrespiratória. (Jaci Azevedo, filha)
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