quinta-feira, 24 de dezembro de 2020

DO DIREITO À UVA-PASSA E A OUTRAS COISAS MAIS - Maria Marcela Freire

 


Do direito à uva-passa e a outras coisas mais

Maria Marcela Freire 


Dezembro de 2020. As pessoas , entre tantas outras coisas, se ocupam, diante de uma pandemia mundial, em fazerem memes desdenhosos acerca da inocente e inculpável uva-passa. Além de ridicularizarem o valioso significado da versão brasileira da música: "So this is christmas" (Então é  natal). 

Como se não bastasse, hoje, véspera de natal, elas resolveram limitar os filmes com esta temática na sessão da tarde, com medo de correrem o risco de serem acometidos pela temível  pieguice natalina crônica. 

Pois bem. Meu sobrinho de três anos tem sido poesia nesta vida tão ainda severina pelo fato de ainda, talvez, não ter sido infectado pelo vírus do desdém cotidiano. Para ele, tudo ainda soa como novidade e, por isso, dou-lhe o direito de não gostar de uva-passa , de não saber ou querer cantar " Então  é  natal " e/ou até  mesmo de parar um instante para assistir a filmes de natal. 

Vez em quando ele, em seus ricos  processos imaginativos, me chama de " pofessora" e finge ser meu minúsculo quarto, uma sala escolar. Quando aceito o título Honório e o incluo na estória confabulada, ele diz inocentemente: não sou aluno, sou Mateus Henrique! 

Ele está certo. Aluno, etimologicamente falando diz-se ser alguém sem luz e esta, Mateus tem de sobra. 

Percebi ontem que, assim como eu, Mateus tem certo apreço por janelas. Quis que eu retirasse uma que estava do canto da parede, pronta para ser posta numa casa nova, só para que ele a observasse a exemplo do que ele faz com qualquer coisa que, para ele ainda é desconhecida. 

Há poucas horas do natal, Mateus me fez ficar revoltada. Quero sim o direito a gostar de uva-passa, de cantarolar, sem me sentir ridícula " Então é  natal"  e de assistir a filmes natalinos piegas durante o mês natalino e até mesmo poder estende-los a outros períodos do ano, sim! 

Mateus ainda não sabe, se eu tivesse a capacidade de fazê-lo entender ainda agora...que quando a gente cresce, fica chato pra danado! A rotina cai sobre nossos olhos como uma espécie de venda e sobre nossos ouvidos, em formato de fones que só nos fazem ouvir a mesma música e bem baixa. Além disso, nos amordaçamos (in)voluntariamente  e deixamos de dizer/externar principalmente aquilo que (não) nos agrada.

3 comentários:

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