ATORMENTADA
A menina, seu brinquedo e nada mais. Um jogo de quebra cabeça estava lhe dando trabalho. Há dias que vinha tentando acertar o encaixe das pedras, e nada. Só poderia estar errada a confecção. Foi à cozinha, pegou uma caixa de fósforo e tocou fogo naquela preocupação que estava lhe tirando o sono.
Resolvidos de uma vez por toda os problemas de física que também não a deixavam em paz, rasgou os livros. Já crescida, por discordarem dela, os pais foram assassinados. Presa, teve o próprio braço arrancado por estar doendo durante a madrugada. Depois, acostumada, arrancou a dentadas o pênis do parceiro que não funcionou quando ela desejou sexo.
Após sua execução, chegou ao inferno e já foi agarrando satanás pelo pescoço. Jogou ele dentro de um tonel de água benta e a partir daí passou à administração do mal.
Mandou Lúcifer trabalhar na sujeira dos banheiros sem prazo para promovê-lo a cão assessor da casa dos pecados. Depois, contratou, sem pagar, a um mentiroso para despistar os bem intencionados promovendo festas com o objetivo de tirar a atenção da realidade. Enforcou a mãe de Satanás e a jogou dentro de um caldeirão de cocada de coco transformando tudo em quebra queixo. Rodou a saia e caíram logo dez cães cheios de gangrena no campo de futebol onde estava havendo o jogo da Intriga contra a Inveja. Quando saiu o primeiro gol, os vulcões entraram em erupção. De um torcedor foi arrancado o braço que faltava nela para fazer implante. Deu certo o de um homem com coceira. Ela ficou usando amarrado para não sair se coçando à toa. Chegou à feira e baixou o pau naqueles que queriam pesar mil quilogramas por um quilo. Roubem o quanto puderem, porque aqui só tem vez quem rouba, mata e mente.
Implantou a reunião semanal de maldades para que os aposentados fossem reciclados em golpes cibernéticos. Já chega de dar de comer aos inúteis, porque daqui vocês não tem para onde ir. E a nossa regeneração?, perguntou um que tinha sido condenado ainda menino quando roubar goiaba do vizinho era pecado, porém sua pergunta foi ignorada.
Houve grande modernização da forma de punir por lá. Aquele que tentasse ajudar ao próximo era chicoteado nas partes íntimas até ficar o rombo.
Quando tinha execução a praça se enchia de gente para ver novamente como era sofrer as dores da carne antes da morte. Lá é normal haver comitês que devolvem as dores para o cão sofrer até morrer novamente. Como eles adoram ver gente sofrendo, aqui e acolá há delação premiada. Quem delatar escapa de uma, assim todos apontam uns aos outros e assim vão se entretendo em fazer os outros sofrerem e sofrendo as incertezas de ser o próximo.
Um coitado queria ser o chefe por votação indireta, mas ela foi mais rápida colocando-o de cabeça para baixo com uma vela acesa num buraco que estava disponível. Noites e noites aquela tortura serviu de chamariz para juntar todos onde ela fazia seus discursos encorajando para invadirem o céu. Sua força de persuasão convenceu uma grande maioria que se apossou de dízimos para conseguirem se infiltrar, e a partir daí não sei qual foi o resultado da batalha final.
Heraldo Lins Marinho Dantas
Natal/RN, 11.06
2023 - 19h43min.
A chegada dessa menina no inferno foi mais dramática que a de Lampião. - Gilberto Cardoso dos Santos
ResponderExcluirRisos.
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