FMPB 2024 DA UFRN: A MONTANHA QUE PARIU UM RATO
O Festival Música Potiguar Brasileira (FMPB), criado em 2011 pela Rádio Universitária (88,9 FM) tem o declarado objetivo de valorizar a diversidade musical, “divulgando e premiando gravações inéditas”. Se encontra em sua 11ª edição e tem prestado um nobre serviço à cultura musical do RN. Trata-se de um projeto grandioso que, infelizmente, tem deixado a desejar em sua execução.
Na qualidade de entusiasta do evento, elencarei pontos críticos, merecedores de imediata atenção por parte dos organizadores.
É preciso ter mais cuidado com o descaso, desatenção e/ou desonestidade dos participantes. Alguns parecem não ter lido o edital. No caso de comprovada má-fé, talvez fosse bom pensar em uma punição que vá além da simples desclassificação. O infrator poderia, por exemplo, ser impedido de participar do próximo festival ou pagar uma multa. Isso teria um efeito pedagógico e incentivaria o comportamento adequado. Se a punição continuar sendo a simples desclassificação, o “se colar colou” continuará em alta.
Este festival tem um compromisso com a ética, com a cidadania. O teor das músicas visa promover ideais humanistas. O mesmo se deve esperar dos que participam do festival. Assim como os professores da UFRN são zelosos na correção de trabalhos acadêmicos, deve essa equipe fazer jus ao espírito da instituição e ser rigorosa na análise das composições concorrentes.
É preciso ter um mais claro critério quanto ao lugar em que o candidato poderá se inscrever. Se há fases de classificação em cidades do interior e se o objetivo é estimular a participação de artistas que residem fora da capital, não se deve permitir que concorrentes da capital tenham direito a se inscrever em outros polos, exceto com pertinentes justificativas.
Assisti presencialmente à fase eliminatória em Santa Cruz e fiquei encantado com a qualidade do evento. Chamou-me a atenção a participação de um estrangeiro, um hermano, que viera da região litorânea para se inscrever em Santa Cruz. Perguntei-me por que ele não havia optado por Natal, bem mais cômodo pra ele. Teria sido para ter mais chances e driblar a concorrência na capital? Indagou-me alguém. Após o show, perguntei diretamente a ele se viera apenas para participar do evento, e disse-me que sim.
A música dele obteve o primeiro lugar. Dias depois, descobriu-se que a canção não obedecia aos critérios do edital: não era inédita. Estava disponível há anos no YouTube e já era apresentada por ele em seus shows.
As equipes encarregadas de dar aval a essas composições precisam ser mais criteriosas quanto às possibilidades de plágio ou de falso ineditismo.
Segundo alguns concorrentes, no julgamento ocorrido em 14.11.2024, três ou quatro músicas não deveriam ter direito à participação na finalíssima, pois não eram inéditas. Um dos participantes disse que entraria com ação caso fosse prejudicado no julgamento. Penso eu que deveria ter feito isso antes, não guardar como trunfo para depois dos resultados.
De qualquer modo, essa tarefa compete à comissão julgadora, aos
responsáveis pelo recebimento e aceitação das músicas. Na primeira página do edital,
lemos:
Fico surpreso ao constatar a dificuldade que a equipe responsável pelo Festival parece ter de detectar algo tão fácil de ser descoberto. Seria descaso, pouco empenho, falta de tempo ou o quê? Digo isso porque enquanto assistia pela Net o festival, fiz rápida pesquisa e descobri que a música campeã da noite estava fora do critério estabelecido no edital. Isso ocorreu depois que uma das melhores vozes do evento, em uma de suas falas declarou que sua música era o carro-chefe de um disco, cuja criação e tentativa de divulgação remontava a 2019. Facilmente encontrei um link onde, a partir do minuto 28:27, a música campeã “Passatempo” é cantada e divulgada no podcast do Programa Sons do Brasil da Rádio USP, ocorrido em 22 de dezembro de 2019
https://sonsdobrasil.mus.br/sons-do-brasil-244-cida-lobo-e-edinho-oliveira/
Foi precisamente esta a música campeã!
Decerto será constrangedor, mas a premiação deste ano precisa ser revista, caso, como, se espera, a UFRN prime pela correção e justiça. Pessoas foram prejudicadas nesse festival! Músicas excelentes, e inéditas na correta acepção do termo, ficaram de fora.
É importante que se busque um sistema mais equilibrado de escolha das peças musicais. Na capital, um número bem alto de composições concorre a bem poucas vagas, ao passo que nos demais polos é baixíssima ou nenhuma a concorrência. Na prática, excelentes produções acabam ficando de fora na hora da escolha e outras, não tão boas, acabam entrando na competição. Como resolver esse impasse? É algo que merece a reflexão dos responsáveis pelo projeto.
Quanto à premiação, não há o que criticar. Um valor relativamente bom, embora (a julgar pelo que houve no 10ª Edição) demore-se muito a pagar. O local escolhido para a finalíssima não poderia ser melhor: o Teatro Alberto Maranhão. Lamentavelmente, porém, o sinal de transmissão via Youtube deixou muito a desejar.
Trata-se de um evento grandioso, com significativa repercussão nos círculos acadêmicos e enriquece a cada ano a programação da FM Universitária. Dai a metáfora da montanha. Enorme é o potencial desse projeto, ainda não explorado à altura.
Pelas razões elencadas, percebe-se um desânimo crescente por parte de talentosos artistas que participaram desta e de outras edições. O festival tem perdido credibilidade por causa dessas falhas gritantes e imperdoáveis. Nada, porém, que não possa ser corrigido, principalmente nas próximas edições.
Gilberto Cardoso dos Santos
Link do Festival: https://www.youtube.com/live/KAACRmRoiNk?si=5VwzpldUwQUjZZ-U
Obras de Gilberto Cardoso
Meus parabéns Gilberto pela reflexão sobre o festival. Você tem toda razão! (Marcos Cavalcanti)
ResponderExcluirMuito bem! Que a cultura seja feita com integridade e respeito
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