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terça-feira, 10 de junho de 2025

PRODUTO DA INSÔNIA



 PRODUTO DA INSÔNIA 


Viajando por esse vasto repertório de mentiras, deparei-me com papai Noel conversando com Noé. Um deles dizia que as renas não precisariam embarcar, já que voariam logo que começasse a chover. Saí desse fake apressado para não interferir na história e fui bater direto na Grécia antiga. Lá, procurei por um tal de Sócrates, aquele que diz: "só sei que nada sei". Nada. Ninguém sabia dizer onde ele morava. Ah!, sim, respondeu-me um barbudo. Está sendo inventado por aquele outro barbudo. Ele apontou em direção a um grupo de homens que se coçavam. Quem está inventando Sócrates? Perguntei ao me aproximar. Ele, respondeu o de barba ruiva. Eu não, defendeu-se o morador de teatro, também sem se barbear, e foi logo se retirando como se eu tivesse lepra. Em poucos instantes, o grupo havia se dissipado.

Depois dessa frustração, eu só pensava em ficar nos braços de Salomé, mas não deu. Ela estava ocupada, levando uma cabeça numa bandeja. Para que queres essa cabeça? Não é da sua conta. Logo percebi que bisbilhoteiro não tinha vez no mundo antigo.

Fugi para perto de um monte de gente olhando um doido lavar as mãos. Barrabás, gritou um efeminado, logo eliminado por um Minotauro. Que coisa, pensei. O Minotauro mastigou seu almoço na frente das crianças, porém foi esse o seu erro. Uma delas pegou uma pedra e lascou a cabeça do Minotauro. Aplausos. Qual o seu nome, menino? Quer comprar cocada? Não. Além de matar Minotauro, Teseu também vendia cocada nas sessões de crucificação. Saí apressado para que ele não tivesse tempo para ir pegar uma outra pedra para fazer comigo o mesmo que fez com o Minotauro.

Logo adiante, encontrei uma pedinte. Estava com uma serpente nas mãos. Uma ajuda aqui para essa pobre serpente, pedia ela enquanto comia uma maçã. Cadê seu marido? Aquele sem-vergonha está povoando o mundo. Seu nome é Eva, não é? Pode me chamar de costela, disse ela, puxando a corrente que mantinha Caim sob controle.

Na esquina, dei de cara com um anjo confuso. Procura algo?, pergunte-lhe. O caminho de volta para o Paraíso, disse ele, aflito. Mas acho que Adão trocou as placas. Aproveitou a oportunidade para me oferecer milagres em promoção: compre dois peixes e ganhe cinco pães. Perguntei se aceitava cartão. Só Pix. Tudo bem! Qual é a senha? Céu e Inferno, tudo junto.



Heraldo Lins Marinho Dantas 

Natal/RN, 10.06.2025 - 04h31min.

Um comentário:

  1. Posso dizer, Heraldo, sem medo de errar, que seu texto é uma deliciosa e criativa viagem literária por universos míticos, históricos e religiosos, conduzida com humor refinado e imaginação fértil. Você brinca com o absurdo de maneira inteligente, entrelaçando figuras icônicas como Papai Noel, Noé, Sócrates, Salomé e o Minotauro em uma narrativa surreal e ágil.

    O tom irreverente e as referências inusitadas revelam uma mente inquieta e criativa — como o título sugere —, resultando em uma crônica que diverte, provoca e convida à releitura. Uma verdadeira homenagem à liberdade da imaginação.

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