domingo, 28 de abril de 2019

UM SHOW DE HUGO TAVARES EM MINHA IMAGINAÇÃO - Gilberto Cardoso dos Santos



UM SHOW DE HUGO TAVARES NA MINHA IMAGINAÇÃO

Vendo o momento difícil
Dramático para a nação
Meditei no que faria
Hugo em tal situação
E respirei novos ares
Ao ouvir Hugo Tavares
Em minha imaginação.
Ouvi “Voto aos dezesseis”
E senti desesperança
Ao me recordar de adultos
Que votam feito criança
Pensei em sua cartilha
E vi o quanto hoje brilha
Mais que nunca e nos alcança.

Decerto conosco hoje
Ele também sofreria
Ao drama dos oprimidos
em versos expressaria
Levantaria seu brado
Ao ver que um golpe foi dado
Em nossa democracia.

Falaria de açaí,
De laranjas, goiabeira
De Fake News, de um Brasil
Sem freios rumo à ladeira
Com vigor e ousadia
Citaria a hipocrisia
Da elite vil brasileira.

Reforma da Previdência
Seria um tema central
Em versos embelezados
Pelo verniz musical
Sempre em defesa dos pobres
Contra os nobres nada nobres
Da política nacional.

Lembrei da bela entrevista
Que há tempos me concedeu
Não somente do que disse
Também de como viveu
Quando entre nós habitou
Das lutas que encabeçou
Das pautas que defendeu.

Ele, tão religioso,
Decerto não pouparia
A padres, bispos, pastores
Que em sua moral vazia
Defendessem a tortura
Assumindo uma postura
Que Jesus condenaria.

Na conversa matinal
Ao povo esclareceria
Do sono e da idiotice
A muitos despertaria
Raiva iria provocar
Eu rio ao imaginar
Tudo que Hugo diria.

Sua língua, feito um chicote
Tal qual Cristo iria erguer
Nos que estão acomodados
Decerto iria bater
Em mais de cinquenta tons
De cinza, “Sigam-me os bons”
Poderia nos dizer.

No Espiritismo não creio
No entanto, se acreditasse
A um médium pediria
Que ao poeta incorporasse
A fim de ouvi-lo de novo
E encorajaria o povo
Com o que Hugo falasse.

Gilberto Cardoso dos Santos
Cuité/PB e Santa Cruz/RN



sexta-feira, 26 de abril de 2019

BANCO DE HÉTEROS


MARIA GORDA E A MOÇA DO WHATSAPP - Gilberto Cardoso dos Santos



MARIA GORDA E A MOÇA DO WHATSAPP - Gilberto Cardoso dos Santos

Antes de dormir,  conferi o Zap. Um número desconhecido tinha enviado:

“Oiii”

Cinco minutos depois, repetira:

“Oii”

Olhei a foto, era de mulher. Resisti, fui dormir; deixei para conferir no dia seguinte.
De manhã, cliquei na foto, vi que fora alterada. Jovem bonita, risonha, pele brilhante. Quem seria: Ex-aluna? mãe de aluno? Alguém querendo vender algo?
 Após meu “Bom dia”, enviou um áudio com pergunta bastante inesperada:

“Olá, bom dia. Desculpe incomodar, mas eu queria saber se esse telefone… se esse contato é da boate de Maria Gorda.”

A voz era  agradável, suave e e bem modulada. Antes de responder-lhe, tentei acalmar os pensentimentos recém agitados pelo teor da abordagem. Lembrei de um escritor local e da personagem que protagoniza sua obra, a Maria Gorda. Teria uma coisa a ver com a outra? A princípio não atinei bem, e respondi:

“É não. Você é do RN? Fica onde essa boate? Eu conheço uma Maria Gorda que tinha uma “boate” em Santa Cruz, onde moro.”

“Desculpa então”, disse-me ela. “Fica no Pernambuco”. E citou o município.

“Ah”, disse-lhe, “coincidentemente havia uma Maria Gorda em minha cidade que tinha uma casa dessas. Um amigo e compadre da dona dessa ‘boate’  escreveu um livro em sua homenagem.”

E postei a capa do livro “Crônicas da Casa de Maria Gorda”, de Rosemilton Silva.



Montando melhor o quebra-cabeça, acrescentei:

“Talvez sua busca tenha levado ao blog onde postamos algo sobre ela”.

Ela confirmou:

“Eu não sabia. Eu peguei esse número na Internet. Mas me desculpe ai, tá bom?"

“Então foi isso daí mesmo”. Fui conscientemente repetitivo, buscando manter o diálogo:  “Você estava fazendo uma pesquisa, procurando ‘Maria Gorda’ e, no blog, onde a gente fala sobre ela, achou esse número que é o meu. Uma coincidência bem interessante. Foi bom saber que onde você mora há alguém com este mesmo apelido e que exerce a mesma atividade.”

Retrucou:

“Mas a daqui já faleceu mesmo. Aqui tem uma casa que era dela, tá entendendo? E funciona. É uma boate, mas… é uma boate do sexo, tá entendendo? Eu já ouvi falar muito e por isso que eu pensei que era de lá. Eu não sei aonde fica, nem sei nome de rua,  nada. Eu só peguei o número achando que era de lá pra me informar. Mas, de boa, desculpa ter incomodado”.

Tentei sossegá-la: 

“Não foi incômodo nenhum, amiga. Ficamos felizes quando alguém faz buscas na Net e encontra nosso blog.  Outro dia ocorreu com alguém do RJ. Sinal que aparece bem nos resultados.”

Com certo receio, perguntei:

“Você estava à procura de emprego, alguma coisa?”

A resposta demorou e veio em  voz entrecortada; expressava sinais de angústia:

“É. Eu… tou desempregada, tenho três filhos...e a situação tá bem complicada. Por isso que eu tava procurando. Nunca fiz esse tipo de coisa, nunca precisei… mas aqui na minha cidade não tem serviço. Eu já fiz de tudo pra conseguir serviço e não consegui. E por isso eu tava em busca pra poder eu me informar, sabe, como era... tudo.”

Neste instante parei para pensar no que lhe diria. Senti  certo mal estar. Suas palavras, o modo como as dizia, bem como as circunstâncias que nos conduziram àquele ponto do diálogo, não me deixavam margens para dúvida: eu estava diante de alguém em desespero.
Parei para ouvir as vozes dos eus que me habitam com seus imperativos nem sempre éticos; pensei em minha falecida mãe -  jovem, com 3 crianças; abandonada pelo esposo que se mandara para o sul... -  Décadas depois,  soube do desespero com que enfrentou os obstáculos após o fim do  casamento: carregava água em 3 burros dando assistência a construções e de tudo fez na tentativa de sobreviver e reorganizar sua humilde existência; rendeu-se, inclusive, aos encantos de alguns jovens aparentemente apaixonados. E foi assim que eu nasci.
Muitas coisas pensei e senti nessa  breve pausa: na onda de desemprego que assola o país, na enorme quantidade de jovens depressivas… lembrei de uma que pulou da ponte e levou consigo o filho de dez anos. Uma vozinha atrevida gritou quando meus olhos ficaram úmidos: "Deixa de ser bobo!"
Voltamos à conversa.

“De fato, amiga. A necessidade às vezes é mais forte que a gente.”

“É verdade. Eu sou um tipo de pessoa que eu jamais deixaria meus filhos passar necessidade, tá entendendo? Então, se tivesse que apelar pra esse caminho, eu ia de boa. desculpa aí eu ter pegado o numero errado. Achei que realmente fosse de lá. Desculpa.”

 “Nada. Eu que lhe peço desculpa pela curiosidade. Salvei seu número. se aparecer alguma novidade, lhe digo.”

“Como assim, ‘alguma novidade’? Você trabalha com esse tipo de coisa?

“Não, amiga. Mas a vida tem seus mistérios e às vezes pode pintar alguma proposta, não sei. Caso aconteça, comunicarei a você.”

De fato, leitor, desde que tivemos esse bate-papo,  tenho desejado encontrar um jeito de ajudá-la. Merecerá, de fato, que nos comovamos com sua situação? Tendo a dizer que sim, ainda embalado pelo calor da conversa. Falei  com uma pessoa amiga sobre como poderíamos prover-lhe ajuda. Disse-me que não adiantaria enviar-lhe dinheiro, porque seria uma solução passageira. Quem sabe se o acaso, semente deste texto, de algum modo não proverá uma saída para ela? Nada ocorre por acaso, dizem os místicos. Como consequência, intermediei a venda do livro sobre Maria Gorda a alguém com quem conversei sobre Sânzia. Ao salvar seu número, coloquei  “Sânzia G P”. A partir daqui, só imaginação
Pensei em pedir permissão à senhora Santos para enviar-lhe algum dinheiro, mas tive receio. Esta estranhou o nome.

“Quem é Sânzia GP?”

Expliquei-lhe que “GP” não era “Garota de Programa” e sim “garota pernambucana”
Ontem demorei a pegar no sono; Não me adaptei bem ao sofá. Acordei ainda pensando em como ajudar à jovem mãe. Terá tudo um propósito? Terá o Universo conspirado a favor dessa garota aflita? Só o tempo dirá.  Quiçá, você que me lê, venha a fazer parte dessa conspiração.






sexta-feira, 19 de abril de 2019

SEMANA SANTA - Adriano Bezerra













SEMANA SANTA
Adriano Bezerra

Na era dos meus avós
E no tempo dos meus pais
Chegando a semana santa
Nos três dias principais
O povo se resguardava
E a doutrina respeitava.
Hoje não se importam mais.

Antes nossos ancestrais
Demonstrando a sua fé
Sentindo a dor de Jesus
Se viam na cruz, ao pé.
Viviam seu sofrimento
Com tristeza e com lamento
Feitos Maria e José.

Até pra fazer café
O doce se retirava,
Ficava sem tomar banho,
Cabelo não penteava,
Nem varrer casa podia.
Muita gente nem comia,
Rezando, só jejuava.

Bicho não se maltratava
Nem se ouvia palavrão,
Até mesmo a criançada
Respeitava a tradição
A briga não existia,
E carne ninguém comia,
Só peixe na refeição.

Mas pra nova geração
Tudo isso se acabou
É algo sem importância
Que no passado ficou.
Banalizaram demais!
Quase ninguém sente mais
Tudo o que Jesus passou.

segunda-feira, 8 de abril de 2019

OS CABRAS DE LAMPIÃO , CORDEL E RESENHA

LEIA O CORDEL NO SEGUINTE LINK:

http://docvirt.com/docreader.net/DocReader.aspx?bib=cordel&pagfis=22050


Resenha feita por Francisco Martins, vulgo Mané Beradeiro

OS CABRAS DE LAMPIÃO


 Mané Beradeiro

“Os cabras de Lampião”, um poema épico do cordel brasileiro, classificado como “romance”, pois o texto supera 32 páginas. O autor é Manoel D’Almeida Filho (1914-1995), natural de Alagoa Grande – PB, poeta que faz parte da segunda geração do cordel brasileiro (1920/1930). É sobre este texto que me debruço para escrever mais uma resenha. D’Almeida é um poeta que tem sua marca registrada na história do cordel.
 Quem desejar conhecer esta área não pode e nem deve deixá-lo à margem. É presença na “Antologia da Literatura de Cordel” (BATISTA, 1977, p. 303) e foi membro da Academia Brasileira de Literatura de Cordel – ABLC, sendo o primeiro ocupante da cadeira 20. Marco Haurélio não o deixou fora do capítulo: Pequeno Dicionário Biobliográfico da Literatura de Cordel  e não teme em afirmar: “Os cabras de Lampião, a obra prima  do autor é, indubitavelmente, a melhor biografia em versos sobre o famoso cangaceiro” (HAURÉLIO, 2013, p. 101).
Tomei conhecimento de um fragmento deste texto quando li “Guerreiros do Sol” (MELLO,2004, p. 315), mas somente recentemente eu pude degustar do poema em sua totalidade. A edição que li é da Editora Luzeiro, trazendo a apresentação de Nando Poeta e um texto de Aderaldo Luciano, poeta e pesquisador. Faz 54 anos que este poema foi publicado pela primeira vez, quando em 1965 saiu com o selo da  Prelúdio ( mais tarde, em 1973, passaria a ser chamada de Luzeiro).
Mergulhemos, portanto, no texto e vejamos o que nos traz “Os cabras de Lampião”.

1)          Dos Cangaceiros nomeados

“Lampião formou um grupo
Começou sua carreira,
Doze inclusive os irmãos
Era a sua cabroeira
Que passou a comandar
Sendo esta a vez primeira”
(D’Almeida Filho, 2018,p.10)

 A primeira coisa que iremos saber é que o poeta resgata neste cordel 103 nomes de cangaceiros (veja a lista abaixo), sem contar com os nomes das mulheres e aqueles que antecederam Lampião. Também não somei a esta lista os coiteiros, juízes, coronéis, padres e outras personalidades, que embora não vivessem no bando, não deixavam de ser “Cabras” de Lampião.
A maioria dos homens recebeu um nome de guerra, dado geralmente pelo próprio Lampião.
2)        Do espaço geográfico onde houve ataques, batalhas, sequestros e saques.

Quando entrava nos lugares
Cantava esta canção:
“O meu nome é Virgolino,
Me tratam por Lampião,
E com a revolta sou
Interventor do sertão”
(Idem, p.46)

Levei em consideração o período em que Lampião passou a liderar seu próprio grupo, que no texto é assinalado a partir da  página 10, estrofe 45 ( Lampião formou um grupo ...). As estrofes anteriores tratam da introdução e do batismo de fogo de Lampião. Virgolino Ferreira da Silva, o Rei do Cangaço, reinou de forma altaneira nos estados do Ceará, Rio Grande do Norte, Paraiba, Pernambuco, Alagoas e Bahia, o sertão que ele conhecia.  O poeta D’Almeida apresenta nomes de 50 localidades por onde passou Lampião e seu bando.
No tocante às cidades de Pau dos Ferros, Apodi, Areia Branca e Martins, todas no Rio Grande do Norte, mas precisamente na Mesorregião do Oeste Potiguar, aqui, o poeta D’Almeida cometeu um erro ao escrever que elas pertenciam à zona do Seridó:

Porque antes de chegar
Às portas de Mossoró,
Fez a maior bagaceira
Na zona do Seridó,
Arrasou quatro cidades
Sem de ninguém sentir dó.

Foram as seguintes cidades,
Pelos cabras saqueadas:
Pau dos Ferros e Martins,
Que se viram incendiadas,
Apodi e Areia Branca
Da mesma forma queimadas
(Idem, p.30).

O Seridó é uma região formada por 54 municípios, sendo 28 do Rio Grande do Norte e 26 da Paraíba.




O poeta D’Almeida nos mostra que, embora Lampião fosse um homem de coragem, sempre perdeu quando a população teve tempo para se preparar e enfrentá-lo. Foi assim em Mossoró:
Pois o povo a toda pressa
Em várias ruas cavou
As trincheiras necessárias,
Depois em armas pegou,
Em defesa da cidade,
A batalha se travou
...

Sob uma chuva de balas
Recuaram novamente.
Dessa vez a retirada
Foi definitivamente,
Levando como reféns
Três pessoas na sua frente.
(Ibidem, p. 30 e 31)

E a mesma experiência de derrota aconteceu também quando Lampião e seus cabras tentaram invadir a cidade de Capela:
Num cerco muito bem feito
Lampião viu-se envolvido;
Temendo ser preso ou morto,
Conseguiu sair fugido
De Capela, com o grupo,
Completamente batido.
(Ibidem, p.42)

Ainda sobre a presença de Lampião no Rio Grande do Norte, no tocante ao sequestro do Coronel Antonio Gurgel, no texto do poema, o autor não cita o nome da localidade, mas o escritor Raimundo Nonato da Silva vai esclarecer dizendo que foi em Mato Grande, localizado entre São Sebastião (atual cidade de Dix-Sept Rosado) e Brejo, onde morava o Coronel Antonio Gurgel (SILVA, 1965, p.40)
A lista com os nomes das localidades encontra-se no final.

3)        Teria sido Lampião o pioneiro em cavar um poço de petróleo na Bahia?
Diz o cordel que durante o tempo em que Lampião e seus cabras se esconderam na vasta região do Raso da Catarina, no estado da Bahia,  certa feita ele encontrou petróleo:
                        Um dia cavando um poço,
                        Naquele seu monopólio
                        Saiu uma água suja
                        Gordurosa como um óleo
                        Que ninguém pôde beber
                        Pois podia ser petróleo
                        (Ibidem, p. 44)

O Raso da Catarina compreende 99.777ha, sendo a única reserva biológica de caatinga do mundo. Lá, a temperatura atinge 43º C e água é líquido difícil de ser encontrado. A região tem também seu misticismo. Há uma lenda sobre a fazendeira Catarina que “lutou com a seca, mas foi derrotada por uma nuvem de gafanhotos que devorou a plantação de milho e feijão, deixando-a em estado de loucura e sozinha até o fim da vida. Dizem que seu espírito vaga a localidade ajudando vaqueiros a encontrar animais perdidos”.  Também foi no Raso da Catarina que se abrigou Antonio Conselheiro.
Achei importante trazer este assunto porque há nele um diamante que precisa ser lapidado. Fui cavar no campo da pesquisa e eis que me deparo com Manoel Inácio Barros, engenheiro agrônomo, que em 1930 vivia pela Bahia tentando descobrir petróleo. Tinha até conhecimento da existência do óleo usado pelos campesinos, que utilizavam como combustível para cozinhar. O poço cavado por Lampião foi em 1931, que de forma não intencional acabou encontrando petróleo no Raso da Catarina.  Oficialmente, o primeiro poço de petróleo foi perfurado no dia 29 de julho de 1938, em Lobato-BA.
4)        Tentativa de conversão da moeda da época para o Real de hoje

O leitor vai se deparar com várias estrofes que trazem a nomenclatura da moeda da época.  
Do Coronel Zé Rodrigues Lampião levouseis contos (p,12). Quanto seria isso hoje? Um conto de réis equivalia a mil mirréis (R$ 123.000,00), portanto numa tentativa aproximada o Coronel Zé Rodrigues perdeu para Lampião algo em torno de R$ 738.000,00 (setecentos e trinta e oito mil reais). Deixo abaixo a tabela de conversão para que o leitor faça a atualização.

1 Réis  = R$ 0,123
1     Mirréis (Mil Réis) = R$ 123,00
1 Conto de Réis ( Mil Mirréis) = R$ 123.000,00


5)        As ilustrações

As capas das duas primeiras edições são praticamente iguais, salvo por pequenos detalhes. Afirma  Doutor Aderaldo Luciano: “Uma traz uma indicação na parte superior esquerda com os dizeres “Edição Especial” e o nome do autor em caixa maior, quase centralizado. A outra o nome do autor vem do lado esquerdo, todo em caixa alta”.

(capa da segunda edição)

Ambas as edições (1965 e 1966) tiveram o selo da Prelúdio.  A Segunda edição traz 15 ilustrações.

       A mais recente, 2018, da Editora Luzeiro, também foi ilustrada, desta vez pelo artista Walfredo de Brito, que fez 11 desenhos e a capa.
Sobre o trabalho das ilustrações é inegável afirmar que o autor (não consegui identificar) dos desenhos da segunda edição, não teve a preocupação de fazer um minucioso estudo sobre o espaço físico, geográfico e cultural  no qual se passa a narrativa.  Já na edição recente, é notória a presença de elementos da cultura, o que corrobora a certeza de que Walfredo de Brito teve a preocupação de estudar o modus vivendi das personagens.


6)        Sobre a analogia das três edições

A priori a resenha seria construída apenas com base no que li da última edição, mas quando achava que estava terminando de escrevê-la, eis que sou procurado pelo poeta e pesquisador Dr. Aderaldo Luciano, nome já bastante conhecido no meio do cordel, para que fizesse uma analogia com as edições anteriores.
O Doutor Aderaldo Luciano não pensou duas vezes e me forneceu os textos da editora Prelúdio. Aí tive que ler e reler varias vezes,  e o resultado foi o seguinte: as três edições têm a mesma quantidade de estrofes, isto é: 575, sendo 573 sextilhas, 1 sétima e 1 quintilha (que representa  uma senha dentro da fala do coiteiro Antonio de Chiquinho, p.55), assim sendo, o romance  é composto por 3.450 versos.
Na orelha esquerda da última edição, no texto que escreve o poeta e pesquisador Doutor Aderaldo Luciano, ele cita que há 653 estrofes.  Onde estariam as outras? Teria D’Almeida revisado o cordel e tirado tantas estrofes? Onde Doutor Aderaldo Luciano pegou esta informação?
A resposta que o pesquisador me deu foi que ele se baseou na ficha técnica do cordel que afirma ter 652 estrofes em sextilhas mais a estrofe final (assinatura ALMEIDA), totalizando 653.  Ele confiou na ficha técnica e a informação não bate com a quantidade real, que é de 575 estrofes.
Tive o cuidado de fazer uma leitura de forma vagarosa, sempre em conjunto de 10 estrofes   visando apurar se o texto permanece o mesmo nas três edições.  O achado foi este:
Página 16 (sempre estarei usando a última edição 2018)
 Que a um seu coiteiro traiu (edições 1 e 2)/ Que a um coiteiro traiu (edição 3).
Página 22
Até a última bala ( 1 e 2)/  Até vir a última bala (3)

Página 35
Especialmente, um médico (1 e 2)/ Um médico, especialmente (3)
Página 37
Tá’qui a moça, capitão (1 e 2)/ Eis a moça, capitão (3)
Dificilmente um cangaceiro usaria “Eis” em sua fala. Optaria sempre pela expressão coloquial “Tá’qui”.
Página 40  (a estrofe 322)
Já na estação, o trem
Chegou, saltou um soldado,
Lampião tomou-lhe as armas
perguntou alterado:
-Macaco, se for baiano,
Agora mesmo é sangrado. 

Deixei em negrito “perguntou” porque considero que aqui, o leitor possa achar que o poeta deveria ter usado “afirmou”, pois aparentemente Lampião está afirmando e não perguntando. Na verdade  a afirmação de Lampião contém uma pergunta indireta: queria saber se ele era baiano.
Página 41
Correram a tarde toda (1 e 2)/ Correram uma tarde toda (3)
Página 46
Agora com a revolta (1 e 2)/ E com a revolta eu sou (3)
Página 63
Suspeitou que Pedro Cândido ( 1 e 2)/ Achou que Pedro de Cândida (3)
Era o cabo João Bezerra (1 e 2)/ O tenente João Bezerra (3)
Sobre esta “promoção” de cabo para tenente  a coisa se repete nas páginas 64, 65, 67.

Página 64
Perceba o leitor que aqui houve um desfiguramento da imagem criada pelo poeta D’Almeida e que estão presentes nas edições 1 e 2. Veja:                

                   Um dos grupos dessa tropa
Ele mesmo o comandava,
Outro: o soldado Aniceto,
Em quem muito confiava,
O terceiro: um aspirante
Que Francisco se chamava

Na  edição 3 ficou assim:
                    Um dos grupos dessa tropa
                    Ele mesmo o comandava.
                    Era o sargento Aniceto,
                    Em quem muito confiava.
                    O terceiro: um aspirante
Que Francisco se chamava

Achei que não ficou bem clara a divisão, como estabeleceu o poeta nas duas primeiras edições.

 Página 67
Que se o cabo não estivesse ( 1 e 2)
Caso ele não esteja (3).

Nomes dos Cabras de Lampião

1)   Açúcar
2) Amoroso
3) Ângelo Roque
4) Antonio
5) Antonio de Engraça
6) Arvoredo
7) Asa Branca
8) Asa Negra
9) Ascilino
10)            Azulão
11)             Balão
12)            Barata-Azul
13)            Beija-Flor
14)            Besta-Fera
15)            Bom de Vera
16)            Bom-na-Tabica
17)            Cacheado
18)            Caixa de Fósforos
19)            Cajarana
20)          Cajazeira
21)            Canário
22)          Candieiro
23)          Caninana
24)          Canjica
25)          Carrapicho
26)          Catingueira
27)          Chá-Preto
28)          Chico-Peste
29)          Ciço
30)          Cobra-de-Cipó
31)            Cobra-Verde
32)          Colchete
33)          Come-Cru
34)          Cordão de Ouro
35)          Corisco (Diabo Louro)
36)          Correnteza
37)          Cravinho
38)          Cravo Roxo
39)          Criança
40)          Cruzeiro
41)            Delicado
42)          Demudado
43)          Desconhecido
44)          Deus-Te-Guie
45)          Devoção
46)          Diferente
47)          Elétrico
48)          Esperança
49)          Ezequiel (Ponto-Fino)
50)          Ferrugem
51)            Gato-Bravo
52)          Gorgulho
53)          Gorro
54)          Graúna
55)          Guri
56)          Jararaca
57)          Jitirana
58)          José Baiano
59)          Jurema
60)          Jurema
61)            Lavareda
62)          Limoeiro
63)          Livino
64)          Luis Pedro
65)          Mansidão
66)          Mariano
67)          Marreco
68)          Massiolon
69)          Medalha
70)          Meia-Noite
71)            Mergulhão
72)          Moderno
73)          Moita Brava
74)          Mormaço
75)          Mourão
76)          Nevoeiro
77)          Pai Véio
78)          Pajeú
79)          Pancada
80)          Passarinho
81)            Patori
82)          Pavão
83)          Peitica
84)          Pinga-Fogo
85)          Pinto-Cego
86)          Pó Corante
87)          Português
88)          Quixabeira
89)          Rio Branco
90)          Sabino
91)            Sabino Gomes
92)          Sabonete
93)          Santa Cruz
94)          Sexta-Feira
95)          Velocipe
96)          Ventania
97)          Vicente (Lua-Branca)
98)          Vinte e Cinco
99)          Volta-Seca
100)       Xexéu
101)        Zabelê
102)       Zé do Sapo
103)       Zepelim

Nomes das localidades citadas no cordel

1)          Alagadiço
2)        Ana-Bebé
3)        Angico (onde Lampião morreu)
4)        Apodi
5)        Aquidabã
6)        Areia Branca
7)        Belmonte
8)        Bom Nome
9)        Buíque
10)     Cabrobó
11)      Caminho do Juazeiro do Norte – confronto com a Coluna Prestes
12)     Caminho entre Mossoró e Limoeiro do Norte ( assaltou vários fazendeiros)
13)     Caminho perto de Mossoró – onde sequestrou o Coronel Antonio Gurgel.
14)     Capela
15)     Casa do Coronel Antonio Gurgel ( perto de Mossoró)
16)     Fazenda das Abóboras
17)     Fazenda de Clementino Furtado
18)     Fazenda de Olho D’Agua
19)     Fazenda em Sergipe (não identificada)
20)   Fazenda Melancia
21)     Fazenda Touro
22)   Fazendas de Limoeiro do Norte
23)   Flores
24)   Floresta dos Navios
25)   Gangorra
26)   Gavito
27)   Itapicuru
28)   Jeremoabo
29)   Leopoldina
30)   Martins
31)     Matinha de Água Branca – AL
32)   Mossoró
33)   Pau dos Ferros
34)   Pinhão
35)   Serra de Baixa Verde (onde Lampião é ferido pela primeira vez numa batalha)
36)   Serra do Araripe (Lampião é atingido no peito durante um tiroteio)
37)   Serrinha
38)   Serrote Preto
39)   Sousa
40)   Trecho entre Flores e São João dos Leites
41)     Triunfo
42)   Várzea da Ema
43)   Vila Algodões
44)   Vila da Taboca
45)   Vila da Tapera
46)   Vila de Arrasta-Pé
47)   Vila de Custódia
48)   Vila do Espírito Santo (3x)
49)   Vila do interior de Sergipe (não identificada)
50) ila Malhada da Caiçara (Distrito de Santa Brígida)

Agradeço aos colaboradores Doutor Aderaldo Luciano, Nando do Cordel e Gilberto Cardoso e por fim finalizo a resenha plagiando uma estrofe do autor:

                     Tudo que aqui narrei
                    Dos cabras de Lampião,
                    Li e fiz releitura
                    Pensando no meu sertão.
                    Não tenho culpa se houve
                    Erros na informação.

Parnamirim-RN, 10 a 19 de março 2019

Referências

1)          BATISTA, Sebastião Nunes.Antologia da Literatura de Cordel.Natal: Fundação José Augusto, 1977.
2)        CASCUDO, Luís da Câmara. Nomes da Terra. Natal: Fundação José Augusto, 1968.
3)        D’ALMEIDA FILHO, Manoel.  Os cabras de Lampião. São Paulo: Editora Luzeiro, 2018.
4)        MELLO, Frederico Pernambucano de.Guerreiros do Sol – Violência e banditismo no Nordeste do Brasil. São Paulo: A Girafa, 2004.
5)        HAURÉLIO, Marco. Literatura de Cordel – do sertão à sala de aula. São Paulo: Paulus, 2013.
6)        SILVA, Raimundo Nonato da. Lampião em Mossoró.  Rio de Janeiro: Editora Pongetti, Coleção Mossoroense – Série C – Volume XVI – 3ª edição, 1965.